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Cantiga sinistra

Daniel Freitas

  • 27/12/16
  • 09:00
  • Atualizado há 382 semanas

Gosto muito de ouvir histórias de pescadores, mesmo sabendo que eles inventam e aumentam. Mas gosto também de ouvir histórias de caminhoneiros, porque esses são outros que têm o que contar; afinal, muitos deles passam dias e dias longe de casa cortando estradas por este Brasil afora.

Como por exemplo, a história do João caminhoneiro, que era mais conhecido como João do Caminhão, que eu não sei se realmente aconteceu, mas me contaram e eu quero contar também.

João começou bem jovem na profissão. Em pouco tempo já tinha seu caminhão e com ele dava um bom conforto para a família. Era apaixonado pelo que fazia e tinha seu caminhão como uma extensão de seu lar.

Depois de ter passado 45 dias viajando, João retornou para alegria da esposa e dos filhos, que já estavam morrendo de saudades. Ele estava diferente, nervoso, abatido e chamando a esposa e alguns amigos, lhes fez este estranho relato.

"Já de regresso, eu descia por uma estrada um tanto deserta do estado do Paraná; era quase ao anoitecer de ontem, sentindo-me cansado e com muita sede. De repente, em uma curva, vi uma placa com os dizeres: ¨Fonte de água fresca¨. Diminui a marcha, estacionei, desci, entrei por onde a placa indicava e encontrei a tal fonte. Já me preparava para tomar água quando ouvi uma voz rouca que vinha de algum lugar e que cantava assim: ¨Caminhoneiro que passa apressado, vem beber desta água tão boa, quem beber desta água não vive, quem beber desta água vê Deus¨. Senti um medo horrível e um frio suor desceu pelo meu rosto, minha garganta estava seca e era grande minha sede. A voz se calou e então, com as mãos trêmulas, fiz delas uma concha e tomei daquela água. Em volta tudo era silêncio e quando já me preparava para sair a estranha voz repetiu a macabra cantiga; corri para o caminhão e sai daquele lugar o mais rápido que pude".

João era de falar pouco e não costumava inventar histórias, mas ninguém acreditou nele.

- Nossa João, que história mais fantasiosa, você está é cansado, tome um banho, jante e vá dormir - disse a esposa.

Banho o caminhoneiro tomou, mas não janto. Foi se deitar, mas antes fez o que não era de seu feitio, apesar de ser apegado à família, beijou cada um deles.

João foi sepultado no outro dia; o médico disse que foi enfarto.

Parentes e amigos de João estiveram no lugar descrito por ele, mas os moradores daquelas redondezas informaram que nunca houve placa nenhuma indicando fonte por ali, muito menos uma fonte.

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