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Sadako quer viver

COLUNISTA - José Benjamim de Lima

José Benjamim

  • 07/08/18
  • 18:00
  • Atualizado há 298 semanas

Foi o médico ranchariense já falecido, Dr. Ney Marques Gomes, quem, no final dos anos sessenta do século passado, chamou-me a atenção para um livrinho que fazia muito sucesso na

época, intitulado "Sadako quer viver". O livro, escrito pelo austríaco Karl Bruckner, fala da vida

de uma japonesinha, nascida em 1943, em Hiroshima, morta em 1955, aos doze anos de idade,

vítima de câncer decorrente da radiação produzida pela explosão atômica que sua cidade sofreu, no final da segunda guerra mundial. Quando tinha perto de nove anos manifestou-se a leucemia - conhecida na época como a doença da bomba - moléstia que a matou pouco tempo depois.

No dia 6 de agosto de 1945, a cidade japonesa de Hiroshima sofreu os efeitos da primeira bomba atômica produzida pela inteligência (ou seria barbárie?) humana. O cogumelo atômico que se formou nos céus ficou cravado, permanentemente, na memória da humanidade, como emblema do horror, destruição e morte que a explosão causou. Dois dias depois, outra bomba atômica destruiu a cidade de Nagasaki. Tão ruins quanto os efeitos imediatos das bombas (a morte instantânea e cruel de milhares de pessoas e a destruição das duas cidades), foram as consequências de longo prazo: grande parte dos que sobreviveram adquiriram câncer, por causa da radioatividade, e foram morrendo aos poucos.

Uma dessas vítimas foi a japonesinha Sadako, que tinha dois anos, quando a bomba explodiu em sua cidade. Sobreviveu e teve vida normal até perto dos nove. Era inteligente, ativa, gostava de esportes, corria e competia. Numa dessas corridas, começou a sentir um profundo cansaço. Eram as primeiras manifestações da doença. Durante longos meses, permaneceu internada em hospital, tentando livrar-se da morte.

Em uma visita à doente, sua amiga Chizuco falou de uma antiga lenda, segundo a qual quem

conseguisse fazer mil pássaros de papel, escaparia da morte. Sadako ficou esperançosa e pôs-se a confeccioná-los. Um coleguinha de hospital, também tomado por um câncer decorrente da

explosão atômica começou a ajudá-la. Mas a garota ficava cada dia mais fraca, e não conseguiu

completar os mil origamis, nem mesmo com a ajuda do amiguinho. Chegou aos seiscentos e quarenta e quatro pássaros, antes de morrer. Na data de sua morte, 25/10/1955, seus colegas de escola fizeram os trezentos e cinquenta e seis grous faltantes, para que ela fosse enterrada com mil pássaros.

Após sua morte, os colegas de escola e jovens de todo o Japão recolheram fundos para construir um monumento à memória da menina e de todas as crianças mortas pela bomba atômica. Em 1958, no Parque da Paz, em Hiroshima, foi inaugurada sua estátua, em cuja base está escrito: "Eis o nosso amor / Eis a nossa prece / Para construir a paz no mundo". Todos os anos, no aniversário da bomba, 06 de agosto, milhares de jovens visitam o local, ali depositando pássaros de papel.

Quem sabe Vinicius de Morais tenha-se inspirado na tocante história de Sadako, para escrever

"A rosa de Hiroshima", um dos mais expressivos textos que conheço sobre o tema: "Pensem nas crianças / Mudas telepáticas / Pensem nas meninas / Cegas inexatas / [....> Mas oh não se

esqueçam / Da rosa da rosa / Da rosa de Hiroshima / A rosa hereditária / A rosa radioativa /

Estúpida e inválida / Sem cor sem perfume / Sem rosa sem nada".

Mais de meio século depois de Hiroshima e Nagasaki, a possibilidade de destruição do planeta pelas armas nucleares parece estar esquecida. Mas ela continua latente e provável. Enquanto isso, formas menos globais, mas não menos terríveis de destruição em massa continuam a ser

praticadas diariamente em várias partes do mundo. Os origamis das Sadako que a barbárie

humana vitima todo dia têm sido insuficientes para construir a paz no mundo. Mas o exemplo

da garotinha japonesa no seu amor pela vida continua a ser um marco na consciência da

humanidade.

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