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Aborto, uma questão de saúde pública

Professor Fernando Cândido de Paula

  • 13/06/24
  • 14:00
  • Atualizado há 19 semanas

O debate sobre o aborto no Brasil é uma das discussões mais polarizadas e sensíveis dos últimos tempos. Frequentemente marcado por tensões entre argumentos religiosos, morais e de saúde pública. Recentemente, uma das prioridades do nosso Congresso Nacional, representado pela Câmara dos Deputados, é a introdução do Projeto de Lei - PL -1904/24, apresentado pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que reacendeu a pauta ao propor a equiparação do aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples, inclusive em casos de gravidez que resultarem de estupro.

É essencial que a sociedade compreenda que a criminalização do aborto não resolve o problema, aliás, ao contrário, agrava-o. Quando o aborto é tratado como um crime, as mulheres que precisam interromper a gravidez são forçadas a recorrer a métodos inseguros e clandestinos, locais insalubres, profissionais pouco éticos e incapacitados, enfim, colocam suas vidas e saúde em risco. Estudos, como o realizado pela Guttmacher Institute, demonstram que em países onde o aborto é legal e acessível, há uma redução significativa nas mortes maternas e complicações associadas a procedimentos clandestinos. Portanto, o aborto deve ser abordado como uma questão de saúde pública. Ora, a criminalização não vai impedir que mulheres ricas o façam, mas sim mulheres pobres, mais expostas as vulnerabilidades existentes nesse processo.

Ao tratar o aborto como um crime, especialmente em situações onde a gravidez é resultante de violência sexual, nega-se às mulheres a autonomia sobre seus corpos e eterniza-se um ciclo de violência e sofrimento. Essas medidas punitivas não levam em consideração o impacto psicológico e físico que a continuação da gravidez forçada e indesejada pode causar. A lei deve proteger a saúde e o bem-estar das mulheres, não penalizá-las por circunstâncias na qual elas não tem controle.

A sociedade brasileira precisa urgentemente reavaliar sua postura conservadora em relação ao tema. Não é uma questão de opinião, mas de política pública voltada ao gênero feminino. A influência desproporcional da religião nas políticas públicas distorce a laicidade do Estado e compromete o direito das mulheres à saúde e à própria autonomia. A moralidade individualizada de alguns políticos homens, não pode ser imposta a todos através da legislação. As decisões sobre o corpo e a saúde das mulheres devem ser baseadas através do conhecimento científico e no respeito aos direitos humanos, não em dogmas.

O Estado deve focar na prevenção, na educação sexual, no acesso a métodos contraceptivos como o uso de camisinha, anticoncepcionais e na garantia de um atendimento seguro e humanizado para todas as mulheres. Criminalizar o aborto não previne sua ocorrência, apenas tira o problema a clandestinidade, onde os riscos são muito maiores e o torna público para o julgamento de eventuais setores da sociedade. Somente assim poderemos garantir cuidados médicos seguros para elas, autonomia sobre suas próprias decisões entre levar ou não adiante aquela gravidez, ajudando a construir uma visão mais justa, livre de influências de qualquer natureza: religiosa, moralista e conservadora.

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