*Por Gustavo Pilizari
Jornalista - Mestre em Comunicação
Taciturna, Virginia Woolf segura amarelas flores murchas em seu colo...
Acabara de colhê-las perto de um lago dali - o mesmo lago que a receberá em breve, que a sufocará e a levará aos mundos dos mortos...
Rio Ouse... A última morada de Woolf!
Clarice abraça-a como uma criança recém-abandonada pelos pais.
- Fui o fingimento por toda a vida, Clarice - murmura em fumaça Virginia.
- Todos fingimos minha querida, todos nós... - olhando ao céu, lança os lábios Clarice.
De cabeças baixas, ambas eloqüentes, contemplam o silêncio-mudo debaixo de uma grande árvore.
- Diga a todos que nesta data, neste dia, nesta manhã, fui o meu último espetáculo, minhas cortinas se fecham depois de tantos atos - hoje eu escapo de mim - diz em sonolentas palavras Virginia.
- Que bom que você escolhe morrer quando ainda está viva Virginia - reponde Clarice.
- Minha cara, não é bom termos o martelo da pena, o martelo da decisão final? Que bom sermos o nosso próprio juiz! O Tribunal é findado por mim, eu serei meu advogado, meu juiz, eu me condeno a não mais andar sobre estas charnecas - lembra Woolf
- Antes de ir, você quer algo de mim? - pergunta Lispector.
- Quero aquilo que está escondido, mas que nunca soube o que era...
- Clarice deixa uma lágrima escorrer...
Com seus pés de bailarina, Virginia pega suas flores (finos-longos-brancos dedos), coloca-as em seus bolsos, olha sua Londres amada e lança-se com o compasso do silêncio inquebrável dentro das gélidas águas de sua tumba...
E o epitáfio é escrito em ondas por um corpo que bóia...
*Por Gustavo Pilizari - Jornalista - Mestre em Comunicação