A poesia é o mundo
COLUNISTA - José Benjamin de Lima
Dedicado para Mércia Vasconcellos
Em meio a tantos dias-homenagem, a poesia também tem o seu, 14 de março. É verdade que
atividades dessa natureza andam bastante em baixa, nesse mundo atual, cujos valores são
bem outros. Mesmo no passado, embora ocupasse um lugar mais confortável na tabela de
valores da humanidade, sua posição no ranking das coisas supostamente importantes nunca
foi no topo, nem mesmo na primeira metade superior da lista.
Não para os poetas. Estes fizeram da poesia a sua vida, o que é incompreensível para a grande
maioria dos bilhões de habitantes da terra, que fingem se ocupar de coisas mais sérias.
"Porque fiz eu dos sonhos / Minha única vida? - pergunta Fernando Pessoa, um tanto
perplexo, outro tanto deprimido.
"A poesia é o único real absoluto // Quanto mais poético, mais verdadeiro", escrevia NOVALIS
no século XIX, em plena Era Romântica. Que insanidade! - dizem até hoje (e mais ainda hoje)
as pessoas sedizentes sensatas . Pois se a poesia é pura imaginação, nada tem com a realidade, como pode ser o "único real absoluto"! Será? "Falo de coisas que existem. Deus me livre de inventar coisas quando estou cantando" defende-se, ironicamente, PABLO NERUDA.
Nosso poeta modernista, MURILO MENDES, de certo modo ecoando NOVALIS, deu-nos uma
preciosidade de poema intitulado "O Utopista": "Ele acredita que o chão é duro / [....> / Que há
limites para a poesia / Que não há sorrisos nas crianças / Nem amor nas mulheres / que só de
pão vive o homem [....>". Sim, diz-nos o poeta, com outras palavras, utopia é acreditar que as
coisas sejam aquilo que aparentam ser.
Como percebeu poeticamente (perdão pela tautologia) outro grande poeta, BERTOLT BRECHT: "Não acredites nos teus olhos / Nos teus ouvidos também não / Pode ser que haja luz / E só vês escuridão".
EZRA POUND, outro gigante do mundo da poesia, afirmou em um de seus escritos sobre
literatura: "os artistas são as antenas da raça". O mundo atual, infelizmente, escolheu as
antenas dos celulares, abrindo mão, cada vez mais dos artistas, cujas antenas ficam confinadas a uns poucos guetos que teimam em sobreviver.
Desde que Platão expulsou os poetas de sua República, o mundo nunca mais foi o mesmo. Mas
a poesia sobreviveu e sobreviverá, sempre, ainda que a duras penas, porque ela faz parte
daquilo que é genuinamente humano - a necessidade perene de ir além das aparências e do
que aí está, a necessidade de imaginar, de sonhar e de criar, pondo em palavras nunca ouvidas
antes a beleza e a riqueza da experiência humana.
Giuseppe Ungaretti, poeta italiano dos maiores que a humanidade já produziu, bem sintetizou
poeticamente a questão: "Poesia é o mundo / A humanidade / A própria vida / Florescida na
palavra".
Poesia é humanidade. Poesia é mundo. Viva a poesia!